março 2024

Como a Variação da Taxa de Desconto Afeta os Preços das Ações

Glauco Legat, CFA; Paulo Arbex; Leonardo Cappa

     

      No último artigo, introduzimos o conceito de "duration" aplicado inicialmente a carteiras de títulos de renda fixa. No entanto, é importante ressaltar que os efeitos da variação dos juros não afetam apenas os títulos de renda fixa, mas também qualquer ativo financeiro.

      Para explicar o raciocínio, pense que os juros (SELIC, por exemplo) são taxas de desconto utilizadas para precificar qualquer ativo financeiro, pois representam o custo de oportunidade dos investidores. Em outras palavras, eles refletem a taxa de retorno que um investidor poderia obter ao investir em um outro ativo qualquer, com menor risco.

      Por exemplo, se o custo de oportunidade de um investidor for de 10% ao ano e ele estiver avaliando um ativo que promete retornos de 8% ao ano, ele provavelmente não investirá nesse ativo, pois o retorno esperado é menor, então vale mais a pena investir em um ativo de menor risco. Por outro lado, se o mesmo investidor estiver avaliando um ativo que promete retornos de 12% ao ano, ele estará mais propenso a investir nesse ativo, pois o retorno esperado é maior do que sua taxa de desconto.

     Lembrando que quanto maior o prazo de um investimento, maior a duration dele, ou seja, maior a sensibilidade do preço quando há uma mudança nas taxas de juros. As ações, por não terem um vencimento, diferentemente da renda fixa, são consideradas por ter uma duration muito mais elevada. Logo, qualquer variação que há nas taxas de juros, afeta consideravelmente seus preços.

      Alguns setores são mais sensíveis ao efeito duration do que outros. Por exemplo, empresas caracterizadas como “Valor”, ou seja, que são analisadas por critérios fundamentalistas (análise do balanço patrimonial, geração de caixa), historicamente possuem baixos duration e sensibilidade às alterações nas taxas de juros, justamente por gerarem fluxos de caixa maiores no presente.

      Por outro lado, empresas de tecnologia, que tem alto potencial de crescimento e, que muitas delas ainda não geram lucro, mas tem expectativa de gerar somente no futuro mais distante, tem duration mais elevado e, consequentemente, alta sensibilidade às variações das taxas de juros.

      Um exemplo muito recente e prático deste efeito se deu em 2022 para as principais empresas americanas – Apple (AAPL), Google (GOOGL), Microsoft (MSFT) e Nvidia (NVDA), todas foram amplamente afetadas pelo forte aumento da taxa de juros básicos – FED Funds rate. Outras companhias, menores e menos conhecidas do grande público, mas também negociadas nas bolsas americanas, chegaram a cair muito mais, as vezes 70-80% nesse mesmo momento.

      Estas empresas viram, por outro lado, suas ações se multiplicarem por várias vezes e 2020 e parte de 2021, quando o mercado privilegiou de maneira descompassada essas empresas de altíssimo potencial de crescimento de lucros.

Quando considerar aumentar ou diminuir a duration de uma carteira de ações?

      A regra geral seria a mesma lógica que apresentamos para uma carteira de renda fixa. Em períodos de expectativa de queda das taxas de juros, pode ser interessante aumentar a duration das ações para capturar ganhos com a valorização dos títulos. Por outro lado, em períodos de expectativa de alta das taxas de juros, pode ser sensato diminuir a duration da carteira para reduzir o risco de perdas. A alternativa que normalmente serve de base é construir um portfólio mais balanceado, considerando essas duas classes de ativos de forma conjunta e equilibrar um "duration médio". Por exemplo, caso a carteira de títulos de renda fixa tenha um prazo bem curto, se abre espaço para eventual alocação em ações de empresas com um duration mais longo (empresas de crescimento).

      No entanto, essa relação é apenas uma simplificação para uma única variável que afeta a precificação das ações, sem mencionar nada sobre o fluxo operacional e como ele pode afetar os retornos e perspectivas das empresas. No próximo artigo, falaremos sobre o efeito da alavancagem operacional e financeira, que também afetam financeiramente a rentabilidade das empresas.

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